Novo Programa de Autorregularização Incentivada para Débitos da Secretaria Especial da Receita Federal

Na última quinta-feira, 30/11/2023, foi publicada a Lei nº 14.740, que dispõe sobre a autorregularização incentivada de tributos administrados pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil.

Poderão ser incluídos na anistia todos os tributos administrados pela SRFB que não tenham sido constituídos até a data da publicação da lei, ainda que já sejam objeto de procedimento de fiscalização em andamento. Poderão ser incluídos, portanto, os valores não declarados pelo contribuinte, aqueles que não foram lançados por meio de auto de infração, notificação de lançamento ou declaração de compensação não homologada, mas que venham a ser constituídos entre a data de publicação da lei e o termo final do prazo de adesão.

Os benefícios aplicáveis são os seguintes:

  • Redução de 100% das multas de mora e de ofício;
  • Pagamento de 50% do valor do débito à vista;
  • Parcelamento do saldo em 48 parcelas mensais;
  • Possibilidade de utilização de créditos de prejuízo fiscal e base de cálculo negativa da Contribuição Social sobre o lucro líquido (titularidade própria, controladora ou controlada ou de sociedades controladas por uma mesma pessoa jurídica), limitado a 50% do valor total do débito;
  • Possibilidade de utilização de precatórios (próprios ou adquiridos de terceiros) para pagamento da entrada.

É importante mencionar, ainda, que os valores referentes à redução das multas e dos juros em decorrência da autorregularização não serão computados na apuração do IRPJ, da CSLL do PIS e da COFINS.

Nosso escritório está à total disposição para maiores esclarecimentos sobre o tema.

Manutenção do IPI não recuperável no crédito de PIS/Cofins

Em dezembro de 2022, a Receita Federal do Brasil (RFB), por meio da Instrução Normativa (IN RFB) nº 2.121/2022, passou a prever que o IPI incidente na venda do bem pelo fornecedor não gera direito a crédito de PIS/Cofins.

Trata-se do IPI não recuperável, compreendido como o valor de IPI que foi recolhido pelo fornecedor e/ou indústria, mas que não pode ser compensado pelo adquirente, uma vez que ele não é contribuinte do imposto, como é o caso dos comerciantes varejistas.

Diante da impossibilidade de tomada de crédito, o IPI é tido como não recuperável na escrita fiscal do contribuinte, podendo ser incluído na base de cálculo dos créditos de PIS/Cofins, consoante se depreende das Leis n° 10.637/2002 (PIS) e n° 10.833/2003 (Cofins), em conjunto com os Decretos n° 4.524/2002 (Pis/Cofins) e nº 9.580/2018 (Regulamento do Imposto sobre a Renda – RIR), um vez que o imposto, quando não recuperável, compõe o custo de aquisição do contribuinte.

Tanto é assim que, antes da IN 2.121/2022, a RFB reconhecia expressamente o direito à inclusão do IPI não recuperável da base de cálculo dos créditos de PIS e Cofins (vide INs SRF n° 247/2002 e n° 404/2004, e IN RFB n° 1.911/2019).

Visto isso, os contribuintes podem levar a questão ao Poder Judiciário, sobretudo diante da violação ao princípio constitucional da legalidade tributária, uma vez que a Instrução Normativa extrapolou os limites da Lei.

É de se ressaltar que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já se pronunciou de maneira favorável aos contribuintes em casos semelhantes, isto é, no sentido de tributos não recuperáveis devem ser incluídos no custo das mercadorias, reconhecendo-se o direito de manutenção na base de cálculo dos créditos do PIS e da Cofins (vide RESPs n° 1.568.691 e 1.428.247, que trataram do ICMS-ST).

Especificamente para o IPI, recente decisão da Justiça Federal de São Paulo autorizou o contribuinte a aproveitar na apuração dos créditos o IPI oriundo da aquisição de insumos e bens, desde que esse imposto não seja passível de recuperação. Segundo a decisão, o novo entendimento, adotado na IN 2.121/22, contraria orientação anterior da própria Receita Federal: “A radical mudança de entendimento não foi precedida de qualquer alteração ou inovação legislativa, portanto, justificativa legal não existe para a restrição imposta pela Receita Federal”.

Vale destacar, por fim, que a discussão da matéria pode se dar por meio de mandado de segurança, o qual não tem risco de sucumbência e tem o trâmite mais célere.

Nosso escritório permanece à inteira disposição para maiores informações.

A (falta de) Regulação dos Criptoativos no Brasil

É notória a ascensão dos criptoativos no cenário mundial.

No Brasil, a situação não é diferente e os assuntos relativos a eles são diversos, complexos e, muitas vezes, ainda nebulosos e incertos.

Os criptoativos são ativos virtuais, protegidos por criptografia, presentes, exclusivamente, em registros digitais, cujas operações são realizadas e armazenadas em rede de computadores. Eles surgiram originalmente para permitir a realização de pagamentos ou transferências eletrônicas, sem a necessidade da intermediação de instituições financeiras, trazendo mais agilidade para o processo.

Dentre os diferentes assuntos relativos aos criptoativos, um dos que mais tem gerado repercussão se refere às consequências jurídico-tributárias que o crescimento significativo e acelerado desse mercado pode conferir.

Sobre esse aspecto, não há dúvidas quanto à necessidade de uma efetiva regulação do tema, para que seja garantida a segurança dos investidores, bem como para que exista clareza acerca das obrigações, das responsabilidades e dos procedimentos que devem ser adotados pelos investidores quando operam com a referida tecnologia.

Nesse sentido, observa-se que, no ordenamento jurídico pátrio, não há lei em sentido estrito que trate sobre o tema, apenas orientações infralegais.

Por ser uma tecnologia relativamente nova, essa situação de lacuna legislativa e insegurança jurídica também pode ser observada em diversos outros países do mundo.

Importante notar que, dentre os países que já estão regulando os criptoativos, existem muitos tratamentos e conceituações diferentes associadas à tecnologia, fato que é completamente contrário às recomendações da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e do Fundo Monetário Internacional (FMI), reforçando, ainda mais, a atual situação de incerteza em relação a ela.

Dando enfoque ao cenário brasileiro e ao tratamento das instituições nacionais sobre a matéria, é de se destacar a posição adotada nos pronunciamentos realizados pelo Banco Central (BACEN), o qual entende que os criptoativos não estão sob sua regulação, uma vez que não os reconhece como moedas fiduciárias e, portanto, não os considera inseridos no escopo da legislação relativa aos meios de pagamentos.

A Comissão de Valores Mobiliários, por sua vez, havia se manifestado apontando a impossibilidade da aquisição direta de criptoativos por fundos de investimento e, posteriormente, manifestou-se no sentido de que é possível o investimento indireto, por meio, por exemplo, da aquisição de cotas de fundos e derivativos, entre outros ativos negociados em terceiras jurisdições, desde que admitidos e regulamentados naqueles mercados.

Já a Receita Federal do Brasil (RFB), em linha com as autarquias supracitadas, mas ainda de maneira bem tímida, trata do assunto em sua Instrução Normativa IN RFB 1.888/19[1] e também nos seus manuais de “Perguntas e Respostas” sobre a Declaração de Imposto de Renda das Pessoas Físicas[2].

A Instrução Normativa (IN) RFB 1.888/19, que limita-se a orientar o contribuinte na prestação de informações das operações realizadas com criptoativos ao Fisco Federal, traz as seguintes definições de criptoativos e de exchange de criptoativos:

  • Criptoativos:

“A representação digital de valor denominada em sua própria unidade de conta, cujo preço pode ser expresso em moeda soberana local ou estrangeira, transacionado eletronicamente com a utilização de criptografia e de tecnologias de registros distribuídos, que pode ser utilizado como forma de investimento, instrumento de transferência de valores ou acesso a serviços, e que não constitui moeda de curso legal”.

  • Exchange de criptoativos:

“A pessoa jurídica, ainda que não financeira, que oferece serviços referentes a operações realizadas com criptoativos, inclusive intermediação, negociação ou custódia, e que pode aceitar quaisquer meios de pagamento, inclusive outros criptoativos”.

Com base nos conceitos adotados pela RFB, bem como nas orientações trazidas pela referida IN, é possível entender quais são, atualmente, os dois principais deveres previstos aos investidores em criptoativos:

  • Na realização de operações por meio de exchange nacional, a responsabilidade da transmissão e da declaração da operação realizada com criptoativos ao Fisco Federal, é da própria exchange, retirando tal responsabilidade do investidor.
  • Na realização de operações por meio de exchange estrangeira, ou sem intermediários (peer-to-peer), a necessidade de cumprir com os deveres instrumentais é do próprio investidor. Neste caso, as informações devem ser prestadas sempre que o valor mensal das operações, isoladas ou conjuntamente, ultrapassar R$ 30.000,00.

Quanto à tributação das referidas operações de criptoativos, os manuais “Perguntas e Respostas” sobre a Declaração de Imposto de Renda das Pessoas Físicas são as únicas orientações da RFB sobre o tema. Dos referidos manuais, que passaram a tratar dos criptoativos em 2021, se extrai, em linha com o BACEN e com a CVM, que os criptoativos não são considerados como ativos mobiliários, nem como moeda de curso legal. Entretanto, podem ser equiparados a ativos financeiros e, assim, sua alienação está sujeita à incidência de Imposto de Renda a título de ganho de capital.

Nos manuais, é esclarecido que são tributadas as alienações cujo total mensal seja superior a R$ 35.000,00, segundo alíquotas progressivas estabelecidas em função do lucro. Estão isentas, portanto, as alienações de até R$ 35.000,00 mensais, devendo ser observado o conjunto de criptoativos ou moedas virtuais alienados no Brasil ou no exterior.

Inovando na matéria, o manual de Declaração do Imposto de Renda das Pessoas Físicas de 2022 tornou obrigatória a declaração para cada um dos tipos de criptoativos em que o investidor tenha ao menos R$ 5.000,00 aplicados. Abaixo desse valor, a declaração do bem é opcional.

Como se vê, até o momento, as operações com criptoativos são reguladas de maneira rasa e desconexa da realidade, tanto em relação à própria tecnologia, quanto em relação ao uso que as pessoas vêm se fazendo dela.

Isso porque, sob a ótica da tecnologia, observamos que diferentes tipos de criptoativos estão sendo tratados dentro de rótulos estabelecidos superficialmente, não sendo realizada a devida qualificação e diferenciação das funcionalidades desempenhadas por cada um.

Será que faz sentido os criptoativos presentes em jogos virtuais recreativos terem o mesmo tratamento de moedas digitais, como a Bitcoin, para fins de tributação?

O ouro, por exemplo, é regulado e tributado pela sua função. Assim, as joias de ouro sofrem incidência de ICMS, enquanto o ouro utilizado como ativo financeiro sofre a incidência do IOF. 

Por outro lado, em relação à utilização dos criptoativos, a maior parte das operações são realizadas por pessoas jurídicas, sendo que, até o momento, só existe regulação e tributação para as operações realizadas por pessoas físicas.

Outro fato a se pontuar é o de que o cenário nacional atual conta com o dobro de pessoas investindo em criptoativos do que na bolsa de valores, sendo que os criptoativos não possuem quase nenhuma regulação, enquanto a bolsa de valores é extremamente regulada.

Tendo em vista todos os aspectos levantados, o universo dos criptoativos no Brasil, mesmo estando em plena ascensão, ainda conta com regulações extremamente rasas e imprecisas.

Embora existam alguns projetos de lei que versam sobre a matéria nas casas legislativas, para que eles possam suprir as necessidades que o tema demanda, espera-se que os legisladores compreendam plenamente a tecnologia, saibam a conceituar, entendam suas funcionalidades e elaborem regulações assertivas e equilibradas. 

Isso porque, caso a legislação não seja assertiva quanto ao entendimento e definição da tecnologia, as discussões judiciais sobre a matéria podem se tornar extremamente problemáticas, principalmente em relação à materialidade dos criptoativos, como foi possível observar nas discussões acerca dos softwares.

Por outro lado, a legislação precisa ser equilibrada, vez que é necessária a proteção e segurança do mercado em relação aos potenciais e já existentes crimes financeiros, mas sem se demonstrar excessivamente restritiva e proibitiva, pois dificultará o pleno desenvolvimento do mercado no Brasil, afastando o interesse de empresas, recursos e pessoas.

Raphael A. Golz de Moura


[1] Instrução Normativa IN RFB 1.888/19;

[2] Manuais de “Perguntas e Respostas” sobre a Declaração de Impostos de Renda das Pessoas Físicas