Abrir mão de receitas pode até ser uma medida interessante para a presidente Dilma melhorar sua posição na corrida eleitoral, mas é imprescindível que tal “benesse” seja percebida pelo grande eleitorado.

Por outro lado, reduzir o orçamento em prol da classe empresarial, já tão reduzida e acostumada ao massacre, está fora de cogitação. Com esta retórica, o governo federal tem se utilizado de outras manobras para fechar as contas públicas.


No final de 2013 a reabertura do REFIS da crise e a instituição de anistia para setores específicos, aumentou a arrecadação e garantiu o atingimento da meta de superavit primário. Pouco antes, outra manobra, menos comentada, foi a destinação dos recursos da contribuição sobre o FGTS para aumentar as verbas extras para o programa “Programa Minha Casa, Minha Vida”. O ponto é que aqui houve a manutenção de um tributo que já perdeu a razão de existir.

Relembre-se que em 2001, foi criada uma contribuição, a cargo dos empregadores, devida no momento da dispens de empregado sem justa causa e equivalente a 10% (dez por cento) do montante de todos os depósitos realizados a título de FGTS durante a vigência do contrato de trabalho. Diferente da multa de 40% aplicada aos casos de demissão injustificada, esse adicional não é destinado ao empregado demitido.

Embora não tenha sido fixado qualquer prazo de vigência, o referido tributo foi instituído com o propósito específico de recompor as contas vinculadas ao FGTS, atingidas pelos expurgos inflacionários dos Planos Verão e Collor I e, com isso, equalizar as finanças da Caixa Econômica Federal.

Noutras palavras, criou-se um socorro temporário para equilibrar as contas do FGTS por conta das falhas no sistema financeiro nacional durante o período de alta inflação.

À época, o empresariado se insurgiu contra a cobrança, mas o Supremo Tribunal Federal chancelou a exigência, justamente em razão da previsão da destinação do produto de sua arrecadação para recomposição das contas do FGTS. Destaque-se que a afetação das receitas foi justamente o fundamento utilizado pelo STF para legitimar a cobrança.

Ocorre que a Caixa Econômica Federal, gestora do FGTS, divulgou ofício informando que o adicional poderia ter sido extinto em julho de 2012, já que os recursos do FGTS foram recompostos nesta data. Em decorrência, a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei Complementar nº 200/2012, com intuito de estancar a cobrança, cuja finalidade já havia sido alcançada desde 2012.

Entretanto, apesar da vontade da grande maioria do Congresso Nacional em fechar essa conta, a Presidência da República vetou à Proposição Legislativa sob a alegação de impacto orçamentário-financeiro para a União! Desde então, o produto da arrecadação desse tributo passou a ser destinado à conta única do Tesouro Nacional. Nas razões de veto, foram destacadas que a extinção da contribuição “impactaria fortemente o desenvolvimento do Programa Minha Casa, Minha Vida”.

Trata-se de evidente desvio da finalidade para a qual o tributo foi criado, dentro da lamentável linha adotada há algum tempo nesse país: ao invés dos ajustes nas contas públicas partirem de cortes nos gastos desnecessários, passa-se a conta para o empresário.

Muitas empresas têm ingressado com ações para afastar essa exigência no futuro e, também, para recuperar os valores indevidamente recolhidos desde julho de 2012.

As primeiras decisões favoráveis já começaram a sair. E não poderia ser diferente, já que a posição até então consagrado pela Suprema Corte é no sentido de que as “contribuições” fazem parte dos tributos destinados a fins específicos, razão pela qual só podem ser cobradas para atendimento de sua finalidade, encontrando, aí, seu limite constitucional.

Desviada a finalidade de sua criação, há que se submeter a novo processo legislativo para instituição de nova contribuição, dessa vez com receitas destinadas ao Minha Casa, Minha Vida ou a qualquer outro programa que o governo assim pretenda. Resta ao empresariado, portanto, buscar o Judiciário para tirar mais esse peso das suas costas.

Camila A. Bonolo Parisi é advogada do escritório Parisi& Esteves 

Publicado no Diário do Comércio (SP) em 18/02/2014

http://www.dcomercio.com.br/2014/02/17/empresarios-vao-a-justica